30 de outubro de 2010

KING HOW ABLE QUEEN QUEEN


A vida é uma jornada, extraordinária, de papéis picados, jornais rabiscados, cadernos serrados de lado a lado protegendo potes sensíveis. Neles, minhas mãos gentilmente dormem, meus olhos gentilmente olham para o futuro que irá disfarçar todo o mal estar de seguir o caminho que se deve trilhar sem titubear.

A gangorra da alma vai e volta, cheia de pesos de ambos os lados, cheia de auto descaso: não, esse ficou para trás, agora faço questão demais. "Eu só acredito em mim", já diria John, "Eu sou o super homem", já diria Friedrich e eu vou ali, com ela, tomar um cappuccino, a bebida favorita do John McClane, né? Um cappuccino qualquer, tão bom!

A felicidade é uma arma fria, morna, quente, fervilhando, nos cantos da consciência de quem não é feliz. Quem é não é feliz sabe viver, sim. Estou cansado, essa é a saidera antes de dormir. Precaução e descanso nunca é demais. Ter coragem é bom, mas nem sempre necessário. Não se pode controlar o que não se pode medir e, por enquanto, gerencio os indicadores para não fugir do que planejei. A coragem pode esperar: nem ela, nem ninguém tem pressa. Trabalho é trabalho, festa é festa.

12 de outubro de 2010

EM NOME DO FILHO


"Eu não tenho a cor dos teus cabelos, eu não herdei um gesto seu. Mas eu sou o filho da atenção, gesto que só pude ver em você."

Não sei porque, mas numa época em que minha vida está tomando outros rumos, decidi expor um pouco sobre minhas origens.

Creio que, conforme vamos mudando, nossas idéias vão amadurecendo e vamos nos tornamos pessoas diferentes de quem um dia fomos, por isso, é importante olhar para trás e entender como chegamos aqui. Acho que esse processo pode nos ajudar a entender certas coisas e a encontrar soluções para velhos problemas.

Tenho origem muito humilde. Minha mãe, Rosa Angela Oliveira de Moura, nasceu e viveu até sua adolescência em uma cidadezinha no interior das Alagoas, chamada Arapiraca. Lá, vivia junto com sete irmãos e em condições precárias até vir para São Paulo, no começo da adolescência. Das histórias que ela me contava, sobravam muitas da época em que passava fome junto com minhas tias e tios, bem como as lições de nobreza da minha avó, que abdicava do próprio alimento para distribuir o pouco que havia para todos.

No começo da década de 70, todos vieram para São Paulo. Meu avô tratou de preparar o terreno, aqui, trabalhando sozinho, antes da vinda de toda a família. Aqui em São Paulo, minha vó deu a luz para mais quatro filhos. Isso, definitivamente, tornou a vida ainda mais difícil. Minha mãe começou a trabalhar muito cedo, e passou por muitas dificuldades até completar o supletivo, onde acabou conhecendo meu pai.

Meu pai, Luis Gomes de Moura Neto, também nunca teve uma vida fácil. Meus outros avós decidiram vir do Ceará para São Paulo no fim da década de 50. Minha avó, na ocasião, estava gestante, e deu a luz ao meu pai no "meio do caminho", em Teófilo Otoni, Minas Gerais. Meu avô, já falecido, nem cheguei a conhecer, mas dizem, era excelente pessoa.

Minha outra avó teve mais três filhos aqui em São Paulo e sempre teve o temperamento forte, difícil de lidar. Em contrapartida, meu avô tinha problemas com alcoolismo, o que nunca ajudou na harmonia da casa. As discussões conjugais eram frequentes e no meio de tudo isso estava meu pai, criança, já sofrendo fortes abalos emocionais. Aos 14, com a perda do meu avô, a coisa ficou mais complicada para meu pai e isso lhe trouxe alguns traumas que, após alguns tropeços na vida, foram superados.

Meu pai e minha mãe se casaram em 1983, numa cerimônia humilde, sem buffet, nem salão de festas. A festa, aliás, foi improvisada na casa da minha avó por parte de pai. Choveu naquela noite, e lonas foram colocadas no quintal. No final, deu tudo certo. Eles alugaram uma casa e foi lá que passaram a lua de mel, se é que pode-se assim dizer, com zero requinte. O dinheiro era tão pouco que compraram algumas coisas na padaria no dia seguinte ao casamento para o café da manhã e almoço.

O casamento dos meus pais, além de motivado pelo grandioso sentimento que sempre existiu entre eles, foi uma forma de tentar unir forças na esperança de levar uma vida melhor, já que eram tempos difíceis aqueles no Brasil do começo da década de 80.

Meu pai tinha um fusca branco e fez diversos 'bicos' até conseguir um trabalho estável. Minha mãe trabalhava de assistente administrativa numa firma na Zona Sul de São Paulo.

Os dois passaram por grandes dificuldades até o primeiro filho, no caso, eu, nascido dois anos e três meses após o casamento, em Janeiro de 1986.

Contar toda essa história dos meus pais faz com que entenda muitas coisas. Hoje, sou um cara simples, simples mesmo, e capaz de lidar com todo o tipo de gente. Até hoje, muitos da minha família ainda passam por dificuldades. Até hoje, visito muitos deles de tempos em tempos: é a minha origem, e de certo modo me orgulho disso.

Felizmente, meus pais conseguiram me dar uma criação bem melhor do que a deles. E, mesmo que não tenha sido a melhor, até pela nossa condição, nunca me faltou nada, e sempre tive coisas que muita gente próxima nunca teve.

Ao mesmo tempo, fui moleque de rua. Estudei em escola estadual minha vida inteira e a molecada sempre foi da pesada. Passava a maior parte do tempo sentado nas calçadas e aprendendo tudo o que um moleque na rua deve aprender: jogar bola descalço, brigar, empinar pipa, jogar taco, bolinha de gude, bater figurinha, fazer "contra" com o time das ruas vizinhas, escorregar de "shape", rolimã, andar de bike, jogar nos terrões, jogar no salão, aloprar, ser aloprado, sair de casa simplesmente pra "trocar idéia", sofrer com o Corinthians nas intermináveis tardes de domingo ouvindo rádio com o sr. Mariano, bater, apanhar, ver desenho, enfim...

Já minha adolescência se divide entre antes e depois dos Beatles. Ouvir esses caras abriu um portal dentro de mim que nunca mais se fechou. Durante toda a adolescência, participei de campeonatos de futebol, fiz minha primeira corrida de kart e me apaixonei pelo esporte, me aprofundei muito em música e ouvia bandas e bandas e bandas diferentes que ninguém conhecia. Adorava ler. Fiz aula de judô, natação, pintura, piano, filosofia e bateria - esta que, inclusive, toco até hoje. Sempre quis fazer coisas voltadas a arte e ao esporte. Minha adolescência também foi marcada por outra descoberta: o computador e toda onda tecnologica que nos acompanha até hoje.

Hoje, devo dizer que todo esse tempo me trouxe muitos amigos. Gente da mais modesta escala social até gente que, felizmente, tem ótimo padrão de vida. Isso me trouxe uma facilidade extra em lidar com todo tipo de gente. Tenho amigos muito diferentes uns dos outros, no sentido de criação, de origens, de valores e prioridades na vida. Entretanto, hoje, minha gama de amigos mais próximos se parecem mais uns com os outros, o que indica certa unidade neste aspecto.

Todas essas experiências me deram uma visão interessante da vida. Dada toda minha origem, desde os meus avós até a minha criação, creio que ser uma pessoa simples de coração sempre vai ser minha tônica. Naturalmente, se acontecer de passar o resto da vida com alguém, essa pessoa terá de ser simples de coração, definitivamente. E, se essa relação gerar filhos, com certeza esse valor será repassado.

Acredito que essa simplicidade facilita muito nas relações sociais, e ajuda a compreender muitos problemas na sociedade. A partir do momento que você tem um padrão relativamente elevado, mas vê de perto gente abaixo de sua escala social, fica mais fácil pesar as coisas e apontar as direções para a própria vida.

Estar cercado de realidades diferentes mantém a mente aberta, o que dificulta na eterna busca interior para encontrar um meio termo entre egoísmo e altruísmo, ponto este que ando refletindo muito neste ano.

A vida, no fim, é simples. A lição de tudo isso é que, de fato, somos miseráveis. Temos, acima de tudo, necessidades primárias. Nossa intimidade é uma droga, mas é o que somos e, mesmo assim, com educação e respeito ao próximo, a vida pode ser bonita. Eu sei, admito, são palavras clichês, mas, sim, a vida pode ser bonita.

Olhar para baixo faz com que, talvez subliminarmente, valorizemos tudo o que temos. E busquemos sempre melhorar, melhorar, melhorar para fazer da vida uma gangorra progressiva linear.

7 de outubro de 2010

QUALQUER BOBAGEM


Não chegue perto de mim, não precisa falar, não queira me agradar, queira, queira apenas um gole, um sobrevoo pelas avenidas movimentadas de suas perguntas. Não decida, nem pense. Pra quê pensar se o que sente é completo, preenchido, convicto em sombras de árvores amigas, frutos puros, grama verde e garantias vazias.

Não negue, nem se ofereça. Não queira se guardar, não queira se mostrar. Queira, queira. Flutue pelas idéias alheias. Dissemine suas verdades construídas em quociente alto, mente vasta e vasos quebrados. Navegue até certo ponto porque o resto é acaso.

Escute esta canção ou qualquer bobagem. Entorte sua cartilagem para ouvir de novo, ainda que não seja a solução. Gesticule, use a mão, mas nem sempre ouça o coração. Sei lá! Com toda essa mudança de rotina, de marchas, de vida, não preciso de mais nada, nem problemas, nem atenção. Ama-me ou deixe-me em paz.

Deixe-me com minhas sobras de sabedoria para guardar o que penso da vida. Caso contrário, palavras são perdidas, letras se esvaziam em desabafo danoso e petições em descaso culposo. Hoje descobri que andar sozinho é guardar tudo no coração. Saber pra onde ir é apontar a própria direção. A sua opinião é muito importante para nós, mas não dependo disso para desatar meus nós.

6 de outubro de 2010

DEPOIS DAS SEIS


Por Cinthia Montagner (@cinthiamtg) e Mariel Moura (@marielmoura)

Escadas da Cásper. Ladeiras da Augusta. Os ladrinhos paulistanos pretos e brancos tão famosos, hoje substituídos pelo liso concreto moderno. Os bons tempos se foram. As nuvens dos dias passados viraram abstrato, substrato de lágrimas. Os guichês, os bailes, as margaridas nascidas em anos vazios. As calçadas vazias. A cidade respira, invadida: perdeu a paulistanidade das praças, os cumprimentos singelos pela manhã, os passeios largos, as carícias das mesas e as ruas repletas de gentileza.

De todas as épocas, o que sobra é a garoa. A cidade vive desde sempre esse auge sem-identidade tão universal. As pessoas aqui não tem medo, revigoram o tempo inteiro o vigor de suas capacidades, redobram a coragem e se recolhem quando a alma está isolada após uma tempestade de nervos numa tarde pesada.

Aqui, os anos não existem: correm as semanas, as horas, os carros parados que cedo ou tarde insistimos em guiar. Lugar de gente fácil de convencer e comprar. Lugar de noites de inverno ardente, romances frios, corpos inquietos, mentes caladas e corações incertos guiados por motoristas ariscos em horário de pico.

A chuva bate na janela, os pingos emitem sons de sono, de cimento em pilhas que circundam a vida dos amantes silenciados nos quartos. Faz parte de todo habitante essas terras escondidas sob piche quente, ondulado, ora inferno, ora tapete.

Quem é de éssepê vive cercado de riqueza, adora a instantaneidade dos momentos, mas nunca estão satisfeitos. As almas se elevam à medida que o tempo passa e diminuem as parcelas, as doenças, os seguros e as mazelas.