30 de novembro de 2009

O SONHO (NÃO) É POPULAR

E essa confusão, nutrida por um desejo intenso de vingança oriundo de nenhum crime absurdo?

Ninguém entende isso, e não é pra entender. O senso vem das sombras que cada um faz em suas árvores firmes, delicadas. O extravaso é a vazão, é uma manifestação química transformada em força da alma, algo que não existe naturalmente e é disparado de armas cujas balas furam com toda a velocidade.

Olho e vejo um, dois, três nômades perdidos, no sereno do calor noturno, mantidos por boa vontade e por uma esperança vã, de querer ver o amanhã e o que vem depois, sem a menor garantia de que o lar ideal vem para proteger o amor de suas contrariedades.

Uma vontade de vencer sem ver, de não se deixar cegar apesar das forças contrárias, uma vontade que impede o desejo intenso de destruição para deixar nascer o novo, para colocar as peças nos lugares certos, para a transformação do que está escondido e nunca será revelado.

29 de novembro de 2009

DISORDER

Não cabe mais ninguém em São Paulo. Isso não é uma opinião isolada. Estamos numa 'Mumbai' sem planejamento residencial e comercial desde sempre. Digo 'Mumbai' porque, ao contrário do que muitos pensam, São Paulo não é exatamente um pólo de pesquisa e desenvolvimento. São Paulo é uma enorme filial de tudo, que dança conforme as matrizes de países desenvolvidos. As empresas locais são sufocadas. As empresas daqui, em maioria, são centrais de produção, atendimento e distribuição, que, por script, são regidas por diretrizes das matrizes de lá. As pessoas também são regidas assim, pela vontade dos outros, pela vida dos outros, pelo sistema que os outros criam em benefício próprio.

Aqui, o trânsito de paralizar carros, pessoas, rodovias, de trancafiar a qualidade de vida em meios lotados e em quadrúpedes infláveis continua aumentando, descaradamente. Os metrôs e estações são como escadas rolantes de materiais humanos que sabem exatamente o que precisam fazer de segunda a sexta: trabalhar como pequenas engrenagens comuns, cinzentas e sólidas. Nos finais de semana, também sabem exatamente o que fazer: dormir, ver TV, comprar, dormir, ver TV, comprar, se entorpecer, ver TV, dormir e consumir: como um desabafo, como pagar por coisas que as façam parecer menos cinzentas, menos sólidas, mais próprias, particulares, personalizadas.

Ah, a solidão: os amigos sugam, os compromissos sugam, o círculo social se torna um liquidificador de tempo, a família, os parentes velhos por quem demonstramos afeto antes de morrer, os shows que nunca mais veremos, os favores que precisamos fazer sem visão de investimento, apenas por lealdade. As conversas, o conhecimento próprio, que como um parabrisa tira a sujeira da vista pra mostrar imundices da alma.

Dinheiro, o capitalismo que envolve tudo e todos numa teia de interesses. Porque nós, animais, iguais, burros, egoístas, estúpidos e cegos precisamos de coisas maiores, menores, diferentes, deformadas?

Somos ensinados a ser individuais o tempo inteiro, a ser mais competitivos, a superar os outros, a concorrer com os outros, a fazer o melhor de si pensando em si, a trabalhar não visando o bem comum. Aprendemos a ser narcisistas e individuais a vida inteira, como um curso intensivo natural. E nenhuma força política que favorece uma minoria pode ser quebrada pela coletividade partida em fragmentos individuais.

Somos diferentes entre si com necessidades essenciais iguais, e não uniformes com necessidades diferentes.

Dinheiro, recursos, vontades, desejos, amigos, parentes, saúde, trabalho, ensejos, tudo numa roda-gigante desregulada, oval, quadrada, enferrujada. Não quero ter filhos. Quero sofrer sozinho, sendo um habitante urbano, solitário, inserido no inferno invisível e indolor que nos cerca.

23 de novembro de 2009

A VIDA É MAIOR QUE MUITAS FASES FILOSOFAIS

O amor está em baixa, não desfila, nem é grife. A maioria das pessoas nascem com escolhas restritas e liberdades condicionais. Os sonhos desgarraram-se da inocência e do encanto e aderem à gadgets de tecnologia milagrosa e à conquista de bens essenciais: um lar, um carro e uma companhia fisicamente atraente, humilde e leal, como religiosamente aparece na novela como uma personagem cega de uma só face.

A molecada criada a leite com pêra não questiona os atuais paradigmas, passam chapinhas nos cabelos e choram por tragédias banais, saem para brincar, se embreagar, para descobrir o mundo sem a menor responsabilidade, sem o menor senso de dúvida sobre o que parece errado nas coisas primárias que são capazes de enxergar. O homossexualismo crescente não pode ser questionado quando a população cega, de todos os gêneros, se submete a humilhações caras, pagas em boletos mensais sem a menor noção de investimento, sem quantificar o verdadeiro benefício do preço.

Os reis são os mesmos há algum tempo - usufruindo do excesso de poder que os homens não sabem dominar - e se lambuzam.

Ninguém questiona o escambo desregulado dos produtos doentes que consumimos, ninguém se interessa pelas verdadeiras causas do proletarismo escravo-mórbido-rotineiro-robótico-morto-inerte-desumano - exceto àquelas verdades ansiosas que passam nos comerciais.

Cansa ser vítima da cegueira dos outros, e cansa a sensação de impotência que dá ao ver a força extraodinária dos meios que existem para manipulação das massas. Cansa exergar demais e sofrer por aqueles que se preenchem com sonhos finitos e uma satisfação vendida à preço alto, embudida num produto eletrônico que os reis sintetizam como um instrumento máximo de felicidade, dando ao miserável o contato com o que sempre pareceu impossível.

São eles que comandam: os que nascem no suburbio, com o carimbo de submissão na mente, com medo feroz dos que tem poder sobre o pão na mesa e o leite na geladeira, com hora pra entrar e pra sair, com três ou quatro réplicas de pequenos ceguinhos para alimentar: esses, muitas vezes fruto de prazer barato e descuidado, sem instrução. Sim, eles não sabem procriar quando querem, e se sentem assim, sem culpa, sorrindo, como se aqueles pequenos seres fossem bençãos do céu, e afastam a possibilidade de, no futuro, ver os pequenos crescidos sem água, sem trabalho, se submetendo a superlotações em troca de sobrevivência. Imaginam neles a redenção futura da vida ordinária que vivem.

A molecada se apoia em verdades convenientes para poucos poderosos, afastados da nobreza do bem comum, alimentando um egoísmo burro gerado por energia finita fóssil não-renovável. Por quanto tempo os que afastam a neblina dos olhos terão de sofrer as consequências do descaso ao ensino fundamental? Por quanto tempo teremos que pagar três vezes para obter um só benefício essencial ( Governo + ( Garantia Privada + Governo ))?

Por quantas gerações a classe média imunda vai trabalhar cegamente para comprar presentes de natal, de dia dos pais, das mães, das crianças, de aniversários, de páscoa? Ainda, para renovar seus computadores, televisores, eletrodomésticos, gadgets, móveis e afins? Até quando vamos ser chamados de trabalhadores, ladrões, consumidores, da mesma laia, espécie de idiotas e cegos ordinários que custeiam uma ditadura tíbia, de forças ocultas e ventos invisíveis que sopram sempre contra os que enxergam?

Não seria uma boa hora de botar pra foder? Obrigado, Saramago.

16 de novembro de 2009

NÃO É UMA PENA?

Hoje é segunda-feira. Faz calor, e uma garoa de intensidade variável decidiu molhar o teto dos ônibus e das cabeças. A garoa pára, e a água evapora do chão como se estivesse em uma frigideira com fogo médio. Estou onde não deveria, fazendo o que não deveria, me preocupando com relações alheias, equacionando problemas sem solução imediata.

Este é o pior texto da minha vida, e não deveria. Guio-me pela sorte de um vento contra ou a favor. Guio-me pelo acaso e pela cegueira da qual todo mundo sofre, né, Saramago?

Não é uma pena? Não é de se envergonhar?
Como despedaçamos nossos corações e causamos dor um ao outro?
Como pegamos nosso amor, sem pensar em nenhum momento e nos esquecemos de devolvê-lo?

Algumas coisas demoram tanto, mas dá pra explicar?
Por causa de suas lágrimas, seus olhos não enxergam a beleza que os cercam!

Esquecendo-se de devolvê-lo...
Não é uma pena?